A pandemia levou muitas organizações a adotar melhorias necessárias para resguardar seus empregados e operações. Neste sentido, apoiar a saúde mental e o bem-estar dos funcionários tornou-se assunto da vez.

Debater sobre os níveis atuais de esgotamento no trabalho, possíveis estratégias para predizer, mitigar e gerenciar os riscos psicossociais, são formas de evitar perdas humanas e financeiras para as organizações.

Embora a saúde possa ser afetada por variáveis individuais, o ambiente laboral pode contribuir para que haja agravamento de determinadas condições ou favorecer riscos.

O artigo 19 da lei nº 8.213, dispõe que as empresas são responsáveis pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador. Neste caso, prevenir o adoecimento emocional e mental dos empregados é atuar em consonância à legislação.

Conforme estudos da psicodinâmica do trabalho, a organização do trabalho é o principal fator de sofrimento psíquico dentro das empresas. De maneira como o trabalho é executado, falta de autonomia e reconhecimento, mecanização e repetição das tarefas, sobrecarga, estilo de gestão, relações com a chefia e demais colegas e constantes ruídos na comunicação causam sofrimento ao trabalhador (DEJOURS, 1992).

Por outro lado, é possível promover a saúde mental no trabalho, desde que ela esteja no centro da estratégia do negócio. É preciso considerar o próprio ambiente de trabalho e o que ocorre nele, como o primeiro passo para a mudança. Soluções “engessadas”, ações restritas ao “Janeiro Branco”, visões recortadas do perfil de saúde dos empregados, programas compartimentalizados e oferta de benefícios corporativos, estão longe de serem ações efetivas e suficientes.

E QUAIS SÃO OS DESAFIOS PARA NORMALIZAR O CUIDADO COM A SAÚDE MENTAL NO TRABALHO?

1)      Sair da teoria para a prática

Neste sentido, algumas estratégias podem ser implementadas como um "despertar":

  • Análises sobre demanda, controle, suporte social, desequilíbrio entre esforço e recompensa, exaustão emocional, descrença e autoeficácia. Para isso, alguns inventários podem ser úteis como: JDC (Job-Demand-Control ), ERI (Effort-Reward Imbalance), MBI (Maslach Burnout Inventory). 
  • Acolhimento através de canais específicos (quando não há segurança psicológica no trabalho, dificilmente os empregados reportarão situações desafiadoras, tóxicas ao gestor ou RH). Muitos problemas podem ser antecipados com Escuta Ativa qualificada!
  • Efetivação de um comitê de saúde mental com o propósito de manter o tema vivo, conduzir diagnósticos de saúde e bem-estar, bem como a implementação de estratégias necessárias.

2)      Pesos distintos para as saúdes física e mental 

Os riscos de saúde mental, embora invisíveis, devem ser abordados da mesma forma criteriosa e contínua que os temas ligados à segurança física no trabalho, prevenção de acidentes e uso de EPI. 

A gestão de Saúde e Segurança Ocupacional (SSO) de muitas organizações se concentrou  mais na segurança do que na saúde ao longo dos anos. Mas felizmente isso tem mudado. Em Julho/2021, foi lançada a primeira norma internacional com orientações sobre saúde psicológica no trabalho. Trata-se da ISO/FDIS 45003, formulada a partir da ISO 45001 (Sistema de Gestão de Segurança e Saúde Ocupacional).

Ela define quais são os riscos psicossociais, como identificar os perigos e oferece medidas  para ajudar a gerenciar e melhorar o bem-estar dos funcionários, melhorar a resiliência organizacional, o desempenho e a produtividade.

3)      Engajamento das lideranças

Para implementar uma cultura de saúde nas organizações, as lideranças precisam estar engajadas na mudança, desconstruirem conceitos e expectativas equivocadas sobre produtividade e zelarem pelo respeito aos direitos trabalhistas, como o limite máximo de jornada de trabalho e o direito à desconexão. 

Além disso, a mensagem dada pela liderança pode ter alcance maior que a da própria marca empregadora, afinal, pessoas conectam com pessoas, por isso, são os melhores “canais” para disseminação do assunto. Para isso, precisam estar envolvidos e capacitados para o cuidado consigo e com os outros.

Ademais, o trabalhador precisa sentir-se à seguro para demonstrar suas vulnerabilidades, compartilhar problemas que esteja passando, e ter suporte necessário com empatia. Promover a segurança psicológica no trabalho é uma forma de mitigar o preconceito, que muitas vezes torna um importante inibidor para que as pessoas peçam ajuda. 

A SAÚDE MENTAL NÃO CUSTA CARO, A DOENÇA SIM!

O adoecimento com duradouras licenças de saúde prejudica diretamente o trabalhador, sua família e a empresa. De forma indireta, impacta a sociedade, por meio do uso da rede de saúde e afastamentos custeados pelo INSS.

Só no ano de 2020, foram quase 300 mil trabalhadores afastados, com uma alta de quase 30% na concessão de aposentadorias por invalidez e auxílios-doença, por problemas como depressão (ECONOMIA SP).

Dito isso, é importante favorecer a predição. Agir de forma reativa, atuando apenas quando o trabalhador precisa se afastar ou quando está em uma situação grave é enxugar gelo. É preciso usar dados e ciência para ter ações custo-efetivas.

Resumindo, ao indivíduo cabe seu autoconhecimento e autocuidado. E às empresas, cabem práticas, políticas e uma cultura psicossocial positiva para relacionamentos e padrões de desempenho sustentáveis. Sem saúde mental não há saúde integral, bem-estar e felicidade no trabalho!